sábado, 19 de janeiro de 2013


A Myriam Rios como legisladora é uma atriz mediana. Propôs, e aprovou, uma lei de péssima qualidade técnica, vaga e, provavelmente, inócua. Melhor assim, pois poderia ser bastante nociva caso fosse menos vaga.

A lei cria um programa para promover a "reflexão sobre a necessidade da revisão sobre os valores morais, sociais, éticos e espirituais". Ora, não se transforma os valores sociais por força de lei. É um processo complexo que atravessa gerações e que só é possível através da alteração das relações sociais. Esta lei, por exemplo, não tem nenhum poder para modificar a monetarização da vida, grande responsável pela banalização da morte.

Não tem poder para modificar o individualismo, a intolerância, a exploração, as desigualdades sociais, o preconceito, o machismo, e nem qualquer um dos pilares do convívio ético entre as pessoas. Não gerará mais solidariedade, mais cooperação e nem ao menos mais gentileza. Pensar que isso pode ser feito através de leis é um tremendo equívoco. Há de se mudar toda a sociedade.

É uma lei é extremamente vaga, que não especifica quais são os bons valores e quais são os ruins. Mas ainda bem que a lei é mal elaborada, pois seria muito mais temerária uma lei que especificasse o comportamento "adequado" para as pessoas. Valores morais são sempre vagos e transitórios, mudam de acordo com os costumes. O que era escândalo ontem, hoje pode ser considerado normal e vice-versa.

Moral é diferente de ética. A moral é hipócrita e geralmente esconde práticas pouco éticas. Os moralistas não estão preocupados com valores como igualdade, diversidade, liberdade e solidariedade. Estão preocupados com o pudor, comportamento sexual e com as práticas religiosas. Moralistas são perigosos para a sociedade.

Um moralista facilmente pode se associar com a bandidagem e manter a sua pose de defensor dos bons costumes. Demóstenes Torres não nos deixa mentir. E cabe a pergunta: quem será convidado para ministrar palestras sobre os valores da família para as nossas crianças? Gays preocupados com valores éticos de igualdade, liberdade e diversidade, ou moralistas hipócritas e conservadores?

Mas devo admitir, esta lei pode gerar ainda um debate bastante interessante em sua regulamentação: a definição dos Valores Espirituais será feita em uma Mesa Branca ou em um Terreiro de Candomblé?

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Democracia! Para as empresas de comunicação...


A democracia moderna parece ser um regime de equilíbrio frágil. Os seus princípios são éticos e irrefutáveis, mas sua prática permite a concentração de poder nas mãos dos principais agentes econômicos, e favorece a perpetuação das elites no poder político.

O regime, concebido e estabelecido nos tempos em que o jornais, televisões, rádios e outros meios de comunicação de massas não existiam, ostenta belos conceitos fundadores: participação universal, bem comum, decisão majoritária, livre formação de consciências e, não poderia deixar de ser citado, o já tradicional balanço entre poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, de Montesquieu. Preceitos nobres que almejam o equilíbrio político na sociedade.

Porém, na prática, a democracia não apresenta resultados compatíveis com as expectativas geradas pelos seus princípios fundamentais. É  esperado um governo "para todos", no entanto, é mais comum o favorecimento às elites, locais, nacionais e transnacionais e, a promoção da concentração de poder.

A livre formação de consciência, um dos pilares da democracia, pressupõe igualdade nas condições de acesso aos bens culturais, sociais e materiais. As condições de igualdade são fundamentais para a aplicação da democracia. Por exemplo, o acesso universal à educação de qualidade pode ser visto como um dos fatores fundamentais para proporcionar uma condição ideal à prática da democracia pois, em tese, nivelaria o jogo político. Mas é uma condição muito difícil de ser alcançada.

Neste cenário, adverso às condições ideais, a posse dos meios de comunicação interfere na livre formação de consciência, influi no processo democrático e desequilibra as forças políticas. Os meios de comunicação canalizam e comercializam o acesso aos bens culturais e sociais, selecionando o conteúdo que lhes convém e sugerindo interpretações políticas das informações que comercializam.

A intencão de interferir na formação de consciência é cotidianamente percebida na propaganda das empresas de comunicação, que frequentemente relacionam sua audiência com o arquétipo do cidadão consciente. Apesar de disfarçarem sua atuação, se apresentando como inofensivos comerciantes de informações, os meios de comunicação são efetivos agentes políticos. E devem ser regulados como tal. As empresas de mídia utilizam como escudo a liberdade de expressão para protegerem seus poderes políticos, e sua pretensa capacidade de manipulação da realidade.

Ora, todas as forças políticas são reguladas. Os donos das grandes empresas de comunicação não são seres especiais, e não devem gozar de um estatuto de cidadania privilegiado. A falta de regulação da atuação política dos meios de comunicação cria condições especiais para operação de grupos de poder organizados em torno de interesses particulares, relacionados aos interesses dos proprietários das empresas.

Assim não há democracia. Há um simulacro de democracia, uma paródia verossímil. Uma gigante representação teatral.

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